21 de setembro de 2007

Quarta matéria para o Revela



Uberaba em alerta

Má alimentação e falta de exercícios físicos levaram os habitantes da cidade um índice alarmante de doenças como diabetes, obesidade e hipertensão arterial


Graziella Tavares
4º período de Jornalismo

Uma pesquisa coordenada pela endocrinologista e professora da Universidade de Uberaba (Uniube), Fernanda Oliveira Magalhães, apurou dados assustadores sobre a saúde da população adulta uberabense. De acordo com os dados, 60% dos habitantes entre 30 e 69 anos de idade estão acima do peso, metade sofre de hipertensão e um terço corre riscos devido às taxas de diabetes. Isso porque mantêm uma péssima alimentação e não fazem exercícios físicos, nem no trabalho.
A história dessa pesquisa começou em 1995, quando os cientistas da universidade se dispuseram a avaliar o índice de diabéticos na cidade. Dez anos depois foi montada a Liga de Diabetes da Uniube e, assim, houve a necessidade de fazer uma investigação mais aprofundada, a fim de que fossem verificados, também, os índices de hipertensão arterial e obesidade, entre outros dados. “O último censo brasileiro de diabetes é de 1987 e a nossa pesquisa seguiu a mesma metodologia empregada pelo IBGE”, afirma Magalhães. “Mas esses resultados são um perfil brasileiro. Nós precisávamos ir além deles e conhecer o perfil dos uberabenses para determinar quais doenças tinham maior prevalência aqui na cidade.”
Assim, entre 2005 e 2007, os pesquisadores se dispuseram a conhecer o perfil da população adulta da cidade (na faixa etária entre 30 e 69 anos), no que se refere a sexo, idade, nível socioeconômico, naturalidade, padrão alimentar, atividade física, tabagismo e doenças mais prevalentes. Em seguida, procuraram determinar os índices de diabetes, hipertensão arterial, obesidade e asma, entre outros indicadores. Deste modo, os médicos poderiam propor ações mais direcionadas para a melhoria da saúde no município. Tendo em vista a importância da iniciativa, o projeto foi aprovado pelo CNPq e pelo Programa de Apoio à Pesquisa (PAPE) da Uniube. Além disso, recebeu o apoio da Roche Diagnóstica e da Prefeitura Municipal. E com a pesquisa ainda em andamento, o grupo de cientistas já chegou a conclusões preocupantes. “O que verificamos foi realmente assustador”, alerta Magalhães.

Os métodos
Mais de setenta alunos de iniciação científica e voluntários dos cursos de Medicina, Odontologia, entre outros, receberam treinamento e acompanhamento de professores da área, até passarem para a pesquisa de campo, que foi determinada através de dados do IBGE sobre os bairros que melhor representam Uberaba. Depois desse levantamento, os estudantes escolheram os entrevistados entre moradores da faixa etária de 30 a 69 anos de idade, homens e mulheres de todos os níveis socioeconômicos, exceto as gestantes. A partir daí, dezenove bairros foram mapeados e as residências visitadas. Segundo Magalhães, é importante lembrar que a metodologia utilizada seguiu um padrão e, por isso, é representativa da cidade.
Durante o período da pesquisa, 1.191 pessoas foram entrevistadas e examinadas detalhadamente em suas casas. A equipe realizou testes como mensuração da pressão arterial, dosagem de glicemia (para verificar a diabetes), cálculo de Índice de Massa Corporal (para observar o sobrepeso) e pico de fluxo expiratório (para identificar asma). Além disso, através de questionários, os pesquisadores obtiveram informações sobre o padrão alimentar e a rotina de atividades físicas das pessoas, além de dados econômicos e sociais das famílias.

Os resultados
Uma das primeiras grandes surpresas para os pesquisadores foi constatar que apenas 37% do total de moradores adultos de Uberaba são naturais da cidade; ou seja, a grande maioria da população daquela faixa etária é composta por pessoas que nasceram em outros lugares. No período retratado, a maior parte (59%) era do sexo feminino, 52,3% tinham trabalho remunerado; 16,6% eram aposentados; 4,1% encontravam-se desempregados e 3,7% estavam afastados por doença. A equipe observou também que a maior parte da população em questão, cerca de 72,6%, possuíam renda mensal familiar abaixo de cinco salários mínimos. Os níveis de escolarização em Uberaba também não eram nada animadores. Entre os adultos, 12% eram analfabetos e 53% possuíam apenas o ensino fundamental. Além disso, 26% possuíam ensino médio e apenas 9% tinham ensino superior. A porcentagem de pós-graduados era praticamente desprezível.
Em relação aos hábitos considerados saudáveis, os pesquisadores constataram que os uberabenses estavam longe de um padrão alimentar ideal. A análise foi feita através de questionários individuais e considerou a ingestão diária de grupos de alimentos como pães, cereais, hortaliças, frutas, leite e derivados; carnes bovina, suína, peixe, frango e ovos; óleo, gorduras e açúcares, de acordo com o recomendado pela pirâmide alimentar. Segundo a pesquisa, apenas 1% da população adulta tinha uma alimentação realmente saudável. Ou seja, a grande maioria tinha uma dieta insuficiente de grãos e cereais (99%); de frutas, hortaliças e leguminosas (82%), assim como de leite e derivados (94%). Por outro lado, a maioria demonstrou um consumo excessivo de óleo vegetal (84%); de sacarose (77%); e de carne (50%). E para piorar, segundo os dados da pesquisa, mais de 80% não realizavam exercícios físicos regulares.
Deste modo, através de centenas de exames médicos, os pesquisadores constataram que 12,7% dos uberabenses eram diabéticos e 20,4% eram pré-diabéticos. Os pesquisadores observaram que 38% desses doentes nem sequer sabiam que estavam com diabetes. Além disso, apenas 25% dos habitantes que já tinham sido diagnosticados estavam controlando a doença com eficácia. Números considerados graves para uma população que consome gordura animal e óleos em quantidades exageradas, come muita carne e poucas frutas e verduras.
Os resultados para a obesidade também foram altos: 18,5% apresentaram obesidade e 36% estavam acima do peso. Mas, se consideramos apenas a obesidade abdominal, ou seja, aquela gordura localizada na barriga, os números são ainda piores: 68,8% das mulheres adultas e 38,87% apresentaram esse tipo de obesidade.
Os números de hipertensão também eram graves: 42,8% da população adulta podia ser considerada hipertensa, e 8,2% estavam no limite. Ou seja, mais da metade da população com mais de 30 anos corria sérios riscos relacionados a esse problema. Os pesquisadores observaram que 35,6% dos hipertensos não sabiam do diagnóstico e apenas 32,7% dos diagnosticados tinham bom controle.
Através dessas amostragens pôde-se verificar os fatores de riscos cardiovasculares, por isso, tabagismo e ingestão de álcool foram pontos-chave da pesquisa. Os números confirmados de quem fumava e consumia álcool diariamente foram baixos, mas o que mais pesou foi a quantidade de pessoas que fumavam e bebiam. A maioria dos problemas de saúde é proveniente desses vícios e agravam-se com o passar do tempo. Não é à toa que os efeitos levaram a altas taxas de hipertensão arterial sistêmica (HAS).

Conclusão
O grupo de pesquisa já conta diversos trabalhos apresentados em congressos nacionais e internacionais da área da saúde. Contudo, mais do que uma produção científica, essa pesquisa trouxe novas perspectivas para os problemas observados na população de Uberaba. “O alerta para uma maior atenção à alimentação e aos exercícios físicos é primordial em todas as idades, principalmente na faixa etária analisada, dos 30 aos 69 anos”, salienta a professora Fernanda Magalhães. E não é preciso nenhum sacrifício nem exageros para ter uma boa saúde. O ideal é manter uma dieta adequada, de preferência receitada por um especialista, e, pelo menos, fazer atividades físicas rotineiras, como caminhada e ginástica.

Boca ameaçada
Com tantos resultados preocupantes, outra análise feita pelos estudantes foi o exame bucal. Nessa etapa, a odontóloga e professora da Uniube, Denise Maciel Carvalho, coordenou e acompanhou todos os procedimentos. Alunos do curso de Odontologia e voluntários foram treinados durante um mês para fazer os exames e, assim, visitaram 91 pessoas, sendo 70 com faixa etária de 35 a 44 anos, já entrevistadas anteriormente pela equipe da professora Fernanda Magalhães. A equipe avaliou a incidência de cáries, doenças periodontais (sangramentos, tártaro e bolsa), lesões nas mucosas e existência de próteses.
Pessoas que mantêm uma má qualidade de vida estão mais predispostas a certos problemas por causa dos hábitos alimentares. “Em geral, os programas de prevenção estão mais voltados para as crianças, mas as pessoas se esquecem de que, com o envelhecimento, é preciso redobrar a atenção à saúde bucal”. alerta Denise. Ela explica que o quadro de doença periodontal pode ser agravado também pelo tabagismo. O fumo, ao longo do tempo, causa lesões nas mucosas e perda dos dentes. Logo, percebeu-se nos exames que 89% apresentaram exposição da raiz ou lesões, 60% tinham sangramento e/ou tártaro e os diabéticos foram os que mais perderam dentes devido à cárie. Com relação as próteses, 39% usavam, mas 30% ainda necessitavam de uma.
Mesmo com resultados parciais, já que apenas 39% do total pretendido foi examinado, a conclusão dos estudantes é que os uberabenses cuidam cada vez menos da sua boca, seja com o que ingerem ou como fazem a higiene.


Pirâmide alimentar



Veja a dieta alimentar diária que os médicos indicam:


Legenda:

1- Óleos, gorduras, açúcares e doces -> 1 a 2 porções
2- Carnes e ovos -> 1 a 2 porções
3- Leite e produtos lácteos -> 3 porções
4- Frutas -> 3 a 5 porções
5- Hortaliças > 4 a 5 porções
6- Cereais, pães, tabérculos e raízes > 5 a 9 porções


Conheça os dados da pesquisa

Análise considerou a população adulta, na faixa etária entre 30 e 69 anos

Diabetes
* 12,7% da população adulta de Uberaba têm diabetes e 20,4% são pré-diabéticos * Dentre os diabéticos, 38% não sabiam que tinham a doença * Apenas 25% das pessoas com diagnóstico prévio de diabetes têm feito um controle efetivo do nível de glicemia

Obesidade
* 18,5% da população de Uberaba é obesa e 36% apresentam sobrepeso * O índice de obesidade abdominal (aquela gordura localizada apenas na cintura) no sexo feminino foi de 68,8% e no sexo masculino, de 38,8%

Hipertensão
42,8% dos uberabenses adultos são hipertensos * Entre os hipertensos, 35,6% não sabiam do diagnóstico * Daqueles que já haviam sido diagnosticados, apenas 32,7% tinham bom controle da pressão arterial

Dados gerais
* A maior parte da população adulta (59%) é do sexo feminino. * 74,71% possuem renda mensal familiar abaixo de 5 salários mínimos. *53% possuem ensino fundamental e 11,7% são analfabetos. * 52,3% têm trabalho remunerado; 16,6% são aposentados; 4,1% encontravam-se desempregados e 3,7% afastados por doença. * Apenas 37% são naturais de Uberaba

Alimentação
A população adulta tem um padrão alimentar inadequado na maioria dos casos: • Insuficiente ingestão de grãos e cereais (99%) • Consumo excessivo de óleo vegetal (84%) • Grande consumo de sacarose (77%) • Consumo insuficiente de frutas, hortaliças e leguminosas (82%) • Consumo excessivo de carne (50%) • Consumo insuficiente de lácteos (94%) • Consumo associado de gordura animal (15%)


Tabagismo e consumo de álcool
* Os indivíduos adultos do município de Uberaba, em sua grande maioria (93,9%) ingerem álcool no máximo uma vez por semana, mostrando baixa prevalência de alcoolismo. * 23% fumam e 43% já fumaram em algum período da vida.